E eu, aterrada e indisposta ao mesmo tempo, por aquela menina bailarina, ali, a quase uns dez metros de altura, saltar e fazer malabarismos com um entendimento despreocupado.
Sem qualquer rede que a suportasse cá em baixo.
A plateia, numa alegria dispendiosa. Uma alcateia de tigres, ou de pessoas com rosto de tigres, a aplaudirem e a rosnarem, a esperarem o inevitável.
Como num sonho.
A prancha que liga a corda ao outro extremo, uma prancha de piratas à espera do salto final.
O salto mortal.
E eu numa agonia só por te ver a ti, menina, a dançar nessa corda bamba imaginária.
Qual corda, dirias tu.
A corda que dança sobre o abismo.
Era isso que sentia, o coração na boca, o estômago nos pés numa vertigem enlouquecida.
Estavas a dançar sobre o limbo da tua vida. E não tinhas medo. Tu própria, bailarina de um circo surreal. Não demonstravas qualquer receio, mesmo quando se ouvia um rosnar mais audível vindo do público. A esperança vã de te ver cair.
Um rosnar em grupo. À espera.
Fui vomitar, as vertigens a explodirem-me na alma incrédula.
No final da tua actuação, abriste as tuas asas de mariposa da noite e voaste sobre as nossas cabeças.